
Você já sentiu que o estresse no trabalho estava prejudicando vários aspectos da sua vida, inclusive sua saúde?
Algum nível de estresse, como desafios, metas e prazos, pode ser benéfico e é importante para incentivar a produtividade. Apesar disso, quando alguém é exposto a níveis de estresse que excedam sua capacidade de se adaptar à situação, pode ocorrer uma série de prejuízos para a saúde do indivíduo.1
O estresse no trabalho tem sido associado a alguns comportamentos maléficos para a saúde, como alto consumo de álcool, tabagismo, maus hábitos alimentares e sedentarismo, possivelmente numa tentativa de administrar o estresse. No entanto, esses hábitos podem piorar os problemas já associados ao estresse ocupacional, como:1
- asma,
- dores nas costas,
- doenças cardiovasculares,
- dores de cabeça,
- ansiedade,
- depressão.
Dessa forma, o estresse excessivo pode levar a insatisfação e práticas inseguras no trabalho, assim como piora no desempenho e aumento de faltas.1 A seguir, vamos abordar alguns aspectos da relação entre estresse ocupacional e saúde mental.
Estresse ocupacional e saúde mental
Certas características do ambiente de trabalho podem levar a danos cognitivos, emocionais e comportamentais, aumentando também o risco de problemas de saúde mental. Na psicologia, o modelo de demanda-controle, desenvolvido por Robert Karasek, é frequentemente usado para examinar essas relações.2
Esse modelo propõe que características-chave do trabalho, como demandas e autonomia de decisão estão relacionados ao estresse psicológico, que pode tanto se manifestar em termos negativos (tensão e doenças) quanto positivos (aprendizagem, motivação e produtividade).3 De acordo com ele, altas demandas de trabalho tendem a induzir altos níveis de estresse, enquanto ter alto controle sobre o próprio trabalho e apoio social ajuda a atenuar o estresse causado por essas demandas.2,3

Um estudo realizado no Canadá combinou diferentes perfis de demanda e controle, buscando entender se eles trariam um aumento no risco para transtornos como ansiedade e depressão.4
Com uma amostra de mais de 24 mil pessoas, os autores mostraram que trabalhadores com altas demandas e que tinham pouco controle de seu trabalho têm maior risco de ter depressão.4 Além disso, a falta de apoio social no trabalho foi associada à depressão, enquanto a insegurança no trabalho foi relacionada a transtornos de ansiedade em ambos os sexos. Isso mostra, portanto, um impacto na saúde mental que não pode ser ignorado.4
Apesar do estresse no trabalho representar um grande problema econômico e de saúde pública, o impacto do desequilíbrio entre trabalho e vida pessoal pode ser ainda maior. Dados desse mesmo estudo sugerem que o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal/familiar é igualmente importante para homens e mulheres no que diz respeito à saúde mental.4

Demandas no trabalho e vida pessoal
Esse equilíbrio entre vida social e trabalho muitas vezes é prejudicado quando as demandas de trabalho levam a jornadas mais longas e/ou horários de trabalho fora do padrão.
Por exemplo, na maioria dos países asiáticos, trabalhar longas horas é visto como uma demonstração de compromisso com o trabalho. Em países como a Coreia do Sul, aumentos gerais nas demandas de trabalho comumente levam a adoção de horas extras e trabalho em turnos; como consequência, muitos coreanos acabam trabalhando também durante os fins de semana. Essas longas jornadas têm um impacto negativo significativo no equilíbrio entre trabalho e vida pessoal, já que trabalhar em horários fora do padrão está relacionado ao descontentamento com a quantidade de tempo dedicado à familia, principalmente às crianças.5
Um estudo investigando a importância do equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal na Coreia do Sul mostrou que trabalhadores com desequilíbrio na relação entre o tempo no trabalho e com a família tinham risco aumentado para:5
- pior saúde em geral;
- problemas de saúde mental;
- dor de cabeça e fadiga ocular;
- fadiga;
- doenças musculoesqueléticas.
Outro estudo coreano, dessa vez com quase 50 mil trabalhadores, demonstrou que o conflito entre trabalho e vida pessoal está associado com problemas de saúde mental. Os resultados foram semelhantes para homens e mulheres.6

As perguntas para identificar conflito entre trabalho e vida pessoal foram:6
- Quão bem suas horas de trabalho encaixam com seus compromissos sociais ou familiares?
- Nos últimos 12 meses, com que frequência você trabalhou durante seu tempo livre para atender a demandas?
- Qual nível de dificuldade você teria para conseguir tirar uma ou duas horas fora do trabalho para cuidar de questões pessoais ou familiares?
Essas mesmas perguntas podem induzir uma reflexão pessoal importante sobre como estamos administrando nosso tempo, quais aspectos da nossa vida são mais importantes e, caso haja um desequilíbrio entre trabalho e vida pessoal, como essas demandas podem ser manejadas para atingir melhor qualidade de vida.
O que pode ser feito?
Embora os fatores culturais possam influenciar nas relações de trabalho e também na saúde mental, esses dois estudos realizados no Canadá e Coréia parecem refletir uma realidade que se manifesta em muitos outros, senão em todos os países.
Considerando que a saúde mental é multifatorial, existem medidas que podem ser tomadas tanto pelos próprios trabalhadores enquanto indivíduos quanto medidas coletivas que partam das empresas.7 No ambiente de trabalho, uma abordagem integrada visando a saúde mental dos trabalhadores combina contribuições da medicina, saúde pública e psicologia, considerando três pilares:8
- prevenção de problemas de saúde mental, reduzindo fatores de risco através de, por exemplo, medidas de saúde pública e saúde ocupacional;
- promoção de aspectos positivos do trabalho, como explorar as habilidades e pontos positivos de cada trabalhador; e
- administração de problemas de saúde mental, independentemente da causa.
Ainda sobre características laborais, uma meta-análise publicada recentemente mostrou que a redução da carga de trabalho sem redução salarial melhora o sono, os níveis de estresse e a qualidade da vida profissional. Além disso, pode existir também um impacto em medidas de saúde em geral, como auto-relato de saúde e bem-estar, mas que ainda precisa ser mais explorado.9
Protocolos com meditação Mindfulness também têm sido estudados como intervenções para melhora na saúde mental. Uma metanálise com 23 ensaios clínicos randomizados e controlados apontou benefícios do Mindfulness para ansiedade e estresse psicológico. Também existem resultados que sugerem um benefício dessa intervenção sobre burnout, depressão e desempenho no trabalho.10
Por fim, é indispensável mencionar que a psicoterapia na linha cognitivo-comportamental demonstra benefícios sólidos no que diz respeito à administração do estresse laboral, sendo a intervenção a nível individual com melhores resultados.7
Conclusões
A importância do trabalho em nossas vidas é inegável. O estresse no trabalho impacta a saúde física e mental. Ter altas demandas com pouco controle sobre o trabalho, assim como falta de apoio social ou insegurança no trabalho, está relacionado com pior saúde mental.4 O equilíbrio entre trabalho e vida pessoal é algo que tem sido cada vez mais valorizado, uma vez que estudos mostram que o desequilíbrio entre essas áreas da vida prejudica a saúde física e mental6,7 em diversos contextos culturais e áreas de trabalho.11,12 Sendo assim, é importante direcionar atenção para ter uma vida mais equilibrada, contribuindo para o bem-estar a médio e longo prazo. Algumas alternativas para atingir esse objetivo são: a redução da carga de trabalho,9 programas de meditação Mindfulness10 e psicoterapia cognitivo-comportamental.7
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Referências bibliográficas
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